Os valores eram passados de geração em geração como preciosidades tribais que seriam o norte da existência inteira.
A autoridade amorosa do pai, a firme ternura da mãe, o apoio certo e afetuoso dos irmãos formavam o círculo de proteção em que a família crescia como um todo, fazendo crescer, também, cada um de seus membros.
E as amizades feitas para toda a vida? E os grandes e belos amores em que as moças eram princesas e os rapazes cavaleiros andantes a serviço delas?Havia uma ordem natural das coisas apontando estradas e definindo rumos, sem jamais excluir o romance e o sonho tão necessários à alma.É certo que a perfeição não era alcançada, mas, pelo menos, as gerações eram rios que corriam para o mar e não se perdiam nos desertos.
Hoje o mal está solto. Meninos se drogam e se matam apenas porque torcem por times contrários. As moças dos bailes funks são chamadas de "cachorras" e se orgulham disso.
Pais e filhos guerreiam como adversários.
E a poesia? Onde anda a poesia?
E o romance? Em que brejo se esconde?
O que pode iluminar a escuridão destes tempos? As lembranças.
Nada nos pode tirá-las, pois as vivemos. Como deixar de sorrir ao lembrar aquela mocinha ensinando-me dançar o bolero, dois pra lá, dois pra cá? E o primeiro beijo da primeira namorada enternecendo-me toda vez que o recordo? E meus grandes amigos, que cresceram comigo e, até hoje, são meus grandes amigos?
Vivemos em mundos paralelos: o de agora, em que assistimos estáticos o caos, e o de antes, quando
sonhávamos, sonhávamos e sonhávamos. ..
O sonho acabou? Não, ele apenas está guardado e retorna todas as vezes em que precisamos de um sorriso.
(Alberto Cohen)